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Skatepark

"Música punk, galera zoeira, rango vegeta, submundo do fanzine xerocado e arte marginal"

Foi há cinco, sete anos. Estava voltando para casa com o meu pai quando notei, de longe, uma aglomeração de pessoas – homens, em sua maioria, na faixa dos 20 anos – na praça dos skatistas, em Mossoró. Com um microfone, alguém anunciava que um torneio estava prestes a acontecer. “Vamos parar”, pedi. “Dar uma olhada no movimento”. Meu pai sequer titubeou. Sem tirar os olhos da pista, ou lançar um olhar de esguelha para a balbúrdia que tanto chamava minha atenção, soltou a sentença seca: “Aí só anda gente sem futuro”. Não questionei. Não era um tom que permitia ser questionado.

 

Cinco, sete anos depois, eu abri uma porta. O que vi foi um homem alto, magro, com os cabelos rebeldes feitos em um rabo-de-cavalo e olhar retraído. Vinha buscar o colega de banda para um ensaio. Esse foi o primeiro contato que tive com Pedro Medeiros, 27, músico das bandas Cätärro e Mahatma Gangue, um dos organizadores do Barulho no Beco, e um dos muitos a quem meu pai chamou sem pensar duas vezes de “sem futuro”. Pedro é cinegrafista, ilustrador, produtor audiovisual, vegetariano e barulhento. Quando pedi que fosse o meu personagem nesse momento invasivo do Vida de Rua, pediu logo que os outros participantes do movimento estivessem presentes. “Somos um coletivo. Para dar mais a cara de grupo”.

 

Nos encontramos em uma praça. Não aquela que reivindicaram para sua música, mas uma reivindicada para o lazer da classe média; crianças corriam pelo parquinho, cinco ou seis praticavam esportes, e no final, lá no finalzinho, onde olhares não podem e não querem chegar, Pedro, André, Marcinho, Aninho e Melissa. Já tem sete anos que estes são alguns dos nomes que dão voz ao punk potiguar e se apossam dos espaços públicos sob o título do sem futuro Barulho no Beco. O movimento, de amigos para amigos, deriva de outras manifestações que acontecem na cidade há mais de dez anos e se utilizam do palco democrático da rua. Não somente música faz parte do cenário de contracultura e práticas libertárias, mas outras manifestações artísticas como o cinema e fanzines, a prática de debates, veganismo, ciclocultura, autoeconomia, e tudo que trabalhe a base do projeto: “faça você mesmo”.

Os encontros costumavam acontecer em um beco na cidade onde durante o dia acontece uma feira ao ar livre de venda de frutas. O Beco das Frutas gerou o Barulho no Beco. O local migrou para o Skatepark da cidade, mas o nome se manteve.

 

O que une os participantes do projeto – além da amizade – é o interesse pela música e a sociedade. Música libertária e democrática, não com cunho financeiro. O projeto de vida de Pedro, apesar de não o ver como meio rentável, é a música. Há 12 anos montou a banda Cätärro com os amigos, e através da convivência com outras bandas e pessoas de outros Estados e países veio o aprendizado em formas de divulgação e organização de seus eventos, disseminando a sua arte transgressora por todo o globo. Marcinho explica: “Não se paga nada para participar. Todos podem curtir juntos. A intenção é essa: levar o conteúdo e a prática libertária às pessoas.”

 

A reação de passantes desavisados como meu pai demonstra que o espanto do público quanto à estética do espaço existe e é compreensível. Tanto as bandas locais quanto os convidados entoam agressividade, um estilo musical diferente de outros eventos culturais organizados em praças públicas da cidade. O choque ao se deparar com as letras das músicas e a forma como são entoadas, o conteúdo dos fanzines, a arte, fala e discurso político oferecem uma quebra de paradigmas e são a forma encontrada para fazer a divulgação de temas pouco discutidos fora dos espaços do Barulho no Beco. Os que passam pela praça veem a aparência, mas não sabem que seus frequentadores em sua maioria não curtem drogas, bebida e são vegetarianos.

 

Tudo isso é um ciclo de eventos que acontece em uma intervenção que dura poucas horas, mas de grito tão alto que ecoa por vários espaços e mantêm viva a cena de contra-cultura mossoroense.

 

Depois de algum tempo de conversa e de participar de algumas de suas intervenções nas ruas da cidade, eu ainda não descobri se o Barulho no Beco ou qualquer de seus frequentadores tem futuro, mas sei que é um futuro que gostaria de ver.

Renata Nolasco

Foto: Acervo do grupo

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